Já estamos em guerra, simplesmente isso não foi comunicado à maioria.

Poupança

Somos diferentes

Já começou a dança dos espanhóis e italianos com a UE e o FMI. O grito de guerra já foi dado antes pela Irlanda e depois por Portugal: somos diferentes! Não funcionou da primeira vez, não funcionou da segunda e já vai a caminho de não funcionar uma terceira vez. Mas com os egos nacionais, sendo o que são, ninguém nos respectivos países vai querer acreditar que os seus parceiros estratégicos estão dispostos a atirá-los pela ravina abaixo. As racionalizações são demasiado agradáveis para encarar essa alternativa; somos culturalmente relevantes, sem nós a zona Euro sofreria demasiado, temos um passado glorioso, etc.

O passado "glorioso"... ou... "ópio para países irrelevantes"

A continuar por este caminho (e não sabendo a evolução a curto-médio prazo das relações China-EUA ou a resolução da crise de liquidez do governo americano – que penso ser um fenómeno mais aparente que real já que nenhum republicano aceitaria as consequências de tal acção seja em nome de que princípios forem) começarão a aparecer estudos, tudo teórico claro, sobre a hipótese da zona Euro a duas velocidades, ou seja, a Europa a sério e os protectorados e estados vassalos. Penso que até os mais distraídos perceberão que isso seria a morte do projecto Europeu e não apenas do Euro. Ninguém vai aceitar um papel de subordinação formal a um outro estado Europeu. Há demasiada história e demasiadas tensões envolvidas para isso ser sequer considerável e não existem amarras financeiras fortes o suficiente para parar esta dissolução uma vez que tiver começado.  Estamos todos esquecidos que ao longo de 1500 anos o que os Europeus melhor fizeram foi lidar com um mundo de alianças flutuantes, guerras constantes, internas e externas, e acima de tudo a união contra qualquer potência hegemónica que surgisse no continente.

Em nome "de la civilisation"?

A segunda guerra mundial mudou muito mas não muda a essência do ser humano e infelizmente começa a ser uma memória de fraco poder vinculativo. É preciso mais que isto para sobreviver à tempestade. Ser bom aluno não chega. As receitas dos mágicos não funcionam, pelo menos, para a maioria das pessoas. A Grécia é diferente e isso não a salvou, a Irlanda é diferente e isso não a salvou, Portugal é diferente e isso não o salvou… Espanha e Itália são também diferentes e isso não as vai salvar.

Ou será em nome da "Zivilisation"?

O único poder deste seguidismo assegurar a construção de uma cintura periférica de “subúrbios/guetos” miseráveis à volta de Europa Central do qual todos faremos parte independentemente das nossas “tão relevantes” diferenças. As empresas que receberão a sua exploração agradecem a confiança e a carta branca que irão ter para ignorar o próprio povo a que presidem – para os mais formalistas não se preocupem porque continuarão sempre a existir eleições e a aparência de um sistema de justiça porque num mundo visual as aparências contam e muito.

Em nome de uma nova política urbanística, compre dentro das suas possibilidades reais.

Nota: No seguimento das minhas notas sobre a privatização como modelo de desenvolvimento já temos como certo um aumento de mais de 25% para comboios na linha Sintra e 22% para o metro de Lisboa. Isto não pode levar a fechar as pessoas em guetos dos quais nem para trabalhar podem sair??? É isto que queremos das nossas cidades? Uma cópia da Europa? Um centro rico com tudo civilizado e uma periferia fechada sobre si própria e entregue aos lobos servindo apenas para espremer rendimentos?? Podemos ser todos diferentes mas corremos o sério risco de ficar todos fechados em infernos incrivelmente similares.


Notas sobre a privatização como modelo social

A)     Todos os serviços privatizados cujo novos custos, imputados ao consumidor, irão aumentar (quer como consequência da privatização quer como prelúdio para a mesma) só farão sentido se existir poupança suficiente para cobrir a diferença de custo.

A sociedade do risco

B)      Mesmo com a taxa de poupança a subir isso não dá certezas de continuidade ao serviço já as medidas de austeridade vão cortar essa poupança e que a maioria que usufrui dos serviços já não consegue acumular qualquer tipo de poupança na situação actual (cerca de 48% do portugueses estão neste grupo dos “sem popança”).

Another one bites the dust...

C)      Podemos limitar então os serviços recém-privatizados apenas aqueles que podem cumprir os novos preçários e nesse caso ficamos com um grande número de excluídos, sem alternativas, e um grupo que sacrifica as poucas poupanças que conseguiu fazer para manter um estilo de vida próximo de uma classe média. De qualquer forma ficam todos com as contas a zero.

Os novos pobres

D)     Se for aceitável excluir cerca de metade da população portuguesa de alguns serviços básicos, como por exemplo os transportes, então caminhamos no sentido do meu anterior post, o isolamento progressivo de algumas classes de pessoas, a sua limitação profissional, de liberdade de movimentos e autonomia cultural.

Podem sempre andar...

E)      Quando o número de excluídos provar ser demasiado grande (e será) poderá existir pressão para resolver a situação e a alternativa mais fácil de propor é subsidiar a empresa privada que fornece o serviço. Logo quer o cidadão que perdeu a poupança acumulada quer o que se viu temporariamente excluído do serviço privatizado irão pagar indirectamente, através de impostos, não só o custo do serviço/produto como também uma margem de rentabilidade a ser negociada com a empresa que deixa de ter que lidar com o factor risco ao se tornar uma fonte de rendas.

Quem entra e quem sai...

F)      Este processo começou há quase 20 anos sem nunca desacelerar e caberá aos cidadãos pensar sobre as suas situações pessoais, assumirem uma posição e tornarem-na clara. Se não o fizerem alguém voltará a tomar essas decisões por eles.